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26/06-2019 Por: Maria Gabriela Campos

Breves considerações sobre a cooperação nacional e seus instrumentos de implementação

O Código de Processo Civil reservou espaços próprios para tratar da cooperação entre os órgãos jurisdicionais, tanto em nível nacional (arts. 67-69) quanto em nível internacional (arts. 26-41).

Especificamente quanto à cooperação nacional, o art. 67 do CPC estabelece que aos órgãos do Poder Judiciário, em todas as instâncias e graus de jurisdição, incumbe o dever de recíproca cooperação, por meio de seus magistrados e servidores.

O dever de recíproca cooperação instituído pelo CPC alerta para uma nova dinâmica da atividade jurisdicional, que revela crescentes esforços no sentido de direcionar a atuação jurisdicional de forma eficiente, seja no âmbito institucional – da própria gestão dos tribunais –, seja no âmbito processual, de gestão do processo (case management).

O art. 69 do CPC, por sua vez, traz um rol exemplificativo dos instrumentos de cooperação. São eles: o auxílio direto; a reunião ou o apensamento de processos; a prestação de informações e os atos concertados, que serão tratados, sucintamente, adiante:

Auxílio direto

O auxílio direto não constitui originariamente um instrumento de cooperação nacional. Sua utilização difundiu-se, primeiramente, no âmbito internacional, como instrumento para perfectibilizar os pedidos de cooperação e assistência judiciária internacionais. Tanto é assim que esse instrumento de cooperação está regulado nos arts. 28 a 34 do CPC, dentro do capítulo que disciplina a cooperação internacional.

O auxílio direto consiste numa modalidade simplificada de cooperação, na qual o intercâmbio entre os juízos cooperantes se dá sem a interferência de outros órgãos ou autoridades.

Nos termos do art. 30 do CPC, o auxílio direto terá como objeto (I) obtenção e prestação de informações sobre o ordenamento jurídico e sobre processos administrativos ou jurisdicionais findos ou em curso; (II) colheita de provas, salvo se a medida for adotada em processo, em curso no estrangeiro, de competência exclusiva de autoridade judiciária brasileira; e (III) qualquer outra medida judicial ou extrajudicial não proibida pela lei brasileira. Conforme se observa dos objetos descritos no dispositivo, o auxílio direto não se limita ao pedido de cooperação jurisdicional, mas compreende, igualmente, a cooperação entre órgãos administrativos e entidades que não integram a estrutura judiciária dos Estados nacionais.

A diferença entre esse mecanismo de cooperação e o tradicional sistema das cartas rogatórias é que o auxílio direto prescinde do juízo de delibação, pela autoridade do Estado requerido, do pedido de cooperação formulado pela autoridade de outro Estado. O pedido de cooperação é diretamente enviado à autoridade central do Estado requerido pelo órgão estrangeiro interessado (CPC, art. 29).

No âmbito do direito interno, o auxílio direto, nos termos do art. 69, I, do CPC, pode funcionar como instrumento de cooperação entre os órgãos jurisdicionais e administrativos integrantes do Poder Judiciário. É possível cogitar, por exemplo, que um tribunal do Estado A solicite, por auxílio direto, informações ao tribunal do Estado B acerca da quantidade e estado dos processos que discutem determinada questão de direito.

O auxílio direto caracteriza-se por ser um mecanismo informal e ágil de cooperação e assistência jurisdicional e administrativa.

– Reunião ou apensamento de processos

Outro mecanismo de cooperação é a reunião ou o apensamento de processos. De acordo com o art. 69, II, do CPC, é possível que o pedido de cooperação seja executado para que haja a reunião ou o apensamento de processos.

A reunião ou o apensamento de processos poderá acontecer nos casos de continência (CPC, art. 56), conexão (CPC, art. 55) e, ainda, nos casos em que, a despeito de não haver conexão, existir o risco de serem prolatadas decisões conflitantes ou contraditórias (CPC, art. 55, § 3º).

O art. 55, caput, do CPC determina que haverá conexão entre duas ou mais ações, quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

Quando entre duas ou mais ações houver algum elemento comum, é conveniente a reunião dos processos para julgamento conjunto, evitando-se o risco de serem prolatadas decisões contraditórias e garantindo-se economia processual. Nesse caso, as ações serão processadas simultaneamente e julgadas na mesma sentença, em simultaneus processus.

A partir da leitura do art. 69, II, do CPC, entende-se que o ordenamento outorga aos órgãos jurisdicionais uma faculdade para determinar a reunião de processos. É que, a depender do caso concreto, a reunião dos processos pode não ser conveniente ou eficiente. É possível que um dos processos conexos esteja num estágio mais avançado do que o outro, por exemplo; nesse caso, a reunião das causas para julgamento conjunto poderia retardar aquele processo mais avançado e próximo de ser julgado, resultando em ineficiência.

O apensamento, por sua vez, consiste na reunião de processos para tramitação simultânea, mas sem autuação conjunta, de forma que cada processo tramitará com sua própria numeração. O apensamento é recomendado para situações em que o motivo da reunião é precário, facilitando posterior desapensamento.

De fato, presume-se que a reunião ou o apensamento de causas para julgamento conjunto garantirá a economia processual, eliminando o risco de haver provimentos contraditórios. Contudo, não se trata de um critério absoluto.

 

Prestação de informações

Os pedidos de cooperação também poderão ser executados para prestação de informações. A prestação de informações deve se dar sem maiores formalidades. É forma de cooperação que, tal como as demais, potencializa-se com a difusão dos meios eletrônicos de comunicação. É possível imaginar a cooperação por e-mail, telefone, aplicativos de mensagem etc.

Esse mecanismo funciona como facilitador das interações interjudiciais, permitindo que os órgãos jurisdicionais tenham livre acesso para trocarem informações relevantes a seus processos. Assim, sempre que um órgão jurisdicional necessitar de alguma informação relevante para o exercício de suas funções, poderá solicitar a cooperação ao juízo cooperante.

 

Atos concertados

São diversos os atos que podem ser concertados mediante pedido de cooperação. A redação do §2º do art. 69 do CPC deixa evidente a falta de taxatividade do rol legalmente previsto.

Os atos concertados são instrumentos de cooperação, por meio do qual os órgãos jurisdicionais concertam procedimentos como forma de racionalizar e otimizar suas atividades. Esses procedimentos podem ter por finalidade a prática de atos de comunicação (CPC, art. 69, § 2º, I), a instrução probatória (CPC, art. 69, § 2º) e a efetivação de decisões (CPC, art. 69, § 2º, III, IV e VI).

Esse instrumento de cooperação mostra-se adequado para a condução de processos complexos ou que envolvam questões repetitivas. É o caso de se imaginar a hipótese de litígios decorrentes de desastres aéreos e ambientais, por exemplo. Nesse caso, é possível que os juízos para onde as causas foram distribuídas concertem atos no sentido de determinar que a colheita da prova testemunhal acontecerá no juízo mais próximo ao acidente, por exemplo. Trata-se de técnica adequada de racionalização e distribuição do trabalho entre os órgãos jurisdicionais.

De igual modo, poderão os juízos concertar atos para centralizar processos repetitivos para julgamento conjunto, como forma de emprestar solução isonômica aos processos. Nessa hipótese haverá uma modificação da competência inicialmente atribuída, que passará a ser do órgão jurisdicional para o qual os processos foram reunidos.